sexta-feira, 18 de junho de 2021
Aviso de despejo
A luta de um clube centenário de São Paulo que pode perder seu terreno e acabar
Todo dia, Francisco Ingegnere, de 67 anos, sai de casa e vai até o Santa Marina Atlético Clube ocupar a cabeça e cuidar dos afazeres de uma instituição centenária que pode estar com os dias contados. O terreno que o clube ocupa desde os Anos 40 está prestes a ser tomado por uma multinacional.
Francisco trabalhou durante quase 40 anos no mesmo quarteirão do bairro da Água Branca, em São Paulo, seguindo os passos do bisavô, do avô e do pai. Todos eles foram operários da Vidraria Santa Marina, famosa por fabricar itens domésticos como aquelas xícaras de cor caramelo que talvez estejam na sua cozinha.
Foi da vidraria que nasceu o Santa Marina AC, orgulho daquelas famílias operárias, em sua maioria italianas como a de Francisco, que trabalhavam, moravam e praticavam esportes no terreno que hoje provoca cobiça. Os bairros próximos se desenvolveram tanto em 100 anos, que o metro quadrado ali parece valer mais do que a própria história: a área foi avaliada em R$ 86 milhões.
O clube é o projeto de vida do presidente Francisco Ingegnere, que desde 1997 cuida para não deixar esta história desaparecer. Famoso na várzea e nas categorias de base, o Santa Marina ainda abriga aulas de futsal e jogos amadores, mas há décadas vem perdendo "pedaços" de seu terreno e pode acabar em menos de 60 dias.
Do círculo central dá para ver a chaminé desativada da vidraria, onde o tempo já quase apagou o nome Santa Marina. O campo de várzea é a última área aberta que o clube ainda detém, espremido entre a rua e o vizinho que já não o quer mais ali. O aperto não é de hoje. Há décadas, o clube vem perdendo partes de seu terreno para a empresa.
A vidraria também já viveu encolhimento: há 50 anos, as construções da Marginal Tietê e da Avenida Ermano Marchetti tomaram parte do espaço, o que a fez demolir uma vila operária para atender a demanda crescente por espaços. Foi neste contexto que a empresa voltou os olhos para o clube vizinho e foi lhe confiscando um pedaço de cada vez. Em 1992, por exemplo, o antigo campo e arquibancadas foram demolidos de um dia para outro.
A disputa atual é entre o clube e a multinacional Saint-Gobain, que se associou à Vidraria Santa Marina em 1960 e é a dona de todo o terreno ao redor. O clube ocupa cerca de 9.600 m², menos da metade do que um dia teve, o que corresponde a 4% dos 232 mil m² que a empresa vizinha tem naquele quarteirão. Parte da vidraria é patrimônio histórico e está tombada pela Prefeitura de São Paulo desde 2009, mas o grupo francês ainda usa os amplos galpões do local.
Atualmente, a Santa Marina aguarda o julgamento de um recurso do pedido de reintegração de posse feito pela Saint-Gobain. É praticamente um tudo ou nada: se o clube vencer, ganha tempo para tentar adquirir o terreno via usucapião (por tempo de ocupação); se perder, deixa de existir.
---------- FONTE UOL.COM
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